Acho que já avisei: sou sistemático.
Mas hoje resolvi escrever um texto em frases curtas.
E parágrafos.
Dirijo meu carro olhando a tela do GPS.
Espero o elevador olhando a tela do meu celular.
Chego ao trabalho e passo o dia olhando a tela do computador.
Descanso em casa olhando a tela da televisão.
Como dizia Milton Nascimento, “Que tragédia é essa que cai sobre todos nós?”
A tela não é tragédia alguma. A desconexão que ela traz, sim.
Em meus repousos diários do trabalho, longe da tela, logo após o almoço, sentava em um banco que ficava em um vão entre dois prédios, uma espécie de corredor. Ali sentavam os cansados da tela e do centro da cidade, em um raro silêncio assombreado, apenas para fazer nada. Um “entre prédios”, estranhamente aconchegante, como o corredor que levava ao quintal da minha casa da infância.

Cadê o banco? Cadê o corredor? Cadê o silêncio? Onde foram os outros cansados?
Como dizia André Dahmer, “o duende da impermanência ataca novamente”.
Não tenho foto desse corredor, nem do silêncio. O lugar onde tanto pensei, esperei e descansei. Está na memória.
Demoliram o prédio. Extinguiram o vão. Pra voltar como era, disseram.
Pra provar que, como quase tudo na vida, o que vai, não volta. Ou volta?
Será que os cansados foram consultados?
Cadê o prédio que estava aqui?
Essa foi uma edição um pouco diferente do Mais Uma Opinião, mas sempre estou por aqui escrevendo sobre psicologia, trabalho, comportamento e outras coisas mais. Os mais lidos estão por aqui. Um abraço.
será que todos os cansados repararam que o prédio não está mais ali? às vezes, enxergamos, mas não vemos.
Que texto, Rodrigo! Adorei de verdade.
Fiquei tão comovida. Uma safadeza sem tamanho o fim do tempo de abrigo.
Guardo uma relação bastante ambivalente com as metrópoles. Penso que a paz finda por se acomodar entre prédios, como as árvores que persistem no tráfego.
Obrigada pela edição.